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Especial: Empregador pode ser responsabilizado por violência sofrida pelo empregado no local de trabalho?

 

    A segurança pública é dever do Estado, nos termos do artigo 144 da Constituição Federal. Mas é também direito e responsabilidade de todos, conforme prevê o mesmo dispositivo. Surge então o questionamento: o empregador deve ser responsabilizado quando um empregado sofre violência enquanto está trabalhando? Nesta matéria especial, veremos como algumas das Turmas do TRT de Minas decidiram casos e situações diversas envolvendo a segurança do trabalhador e como se posicionaram sobre a possibilidade de responsabilização da empresa em cada situação específica.

 

Situação 1 - Caixa de mercearia: teoria do risco criado. 

    Uma operadora de caixa de mercearia, alguns assaltos e a propensão a ter problemas de natureza psicológica. Esse foi o quadro analisado pela 1ª Turma do TRT-MG e que levou a desembargadora relatora Cristiana Maria Valadares Fenelon a reconhecer a responsabilidade do empregador pelos danos causados à trabalhadora em razão de assaltos sofridos no estabelecimento.

    Para a julgadora, a empresa deveria ter adotado medidas eficazes para proteger a empregada. É que apesar de não se tratar de ramo econômico necessariamente de risco, os caixas são visados por criminosos. "O operador de caixa, caso da reclamante, desempenha atividade de risco, encontrando-se deveras vulnerável, por ser verdadeiro chamariz à ação de bandidos", ponderou.

    A situação foi enquadrada na "teoria do risco criado", segundo a qual o risco inerente à atividade desenvolvida pelo trabalhador não pode ser por ele suportado, mas sim pelo beneficiário da mão-de-obra, conforme previsão contida no parágrafo único do artigo 927 do Código Civil. Também pelo enfoque da teoria da responsabilidade subjetiva, que depende da existência de dolo ou culpa, a desembargadora entendeu que o empregador deveria ser condenado "A negligência patronal em adotar medidas de segurança para os seus empregados viola o direito ao desempenho do labor em condições seguras, acarretando a responsabilização da empregadora pelos danos causados ao obreiro", registrou, afastando a possibilidade de se considerar o assalto caso fortuito ou força maior.

    Nesse contexto, foi dado provimento ao recurso da reclamante para condenar a ré ao pagamento de indenização por dano moral no valor de R$10.000,00. (Proc. nº 0010131-24.2014.5.03.0167-RO - Data: 22/09/2014)

 

Situação 2 - Guarda municipal: negligência gera responsabilidade. 

   Em outro caso, a 6ª Turma do TRT-MG, com base no voto do desembargador Rogério Valle Ferreira, deu provimento ao recurso de uma guarda municipal para condenar o município empregador ao pagamento de indenização por dano moral também no valor de R$10.000,00.

   A reclamante trabalhava sozinha em um prédio público quando foi surpreendida por dois homens que queriam roubar o dinheiro contido em um caixa-eletrônico existente no local. Ela permaneceu sob a mira de uma arma de fogo de um dos meliantes, enquanto o outro tentava danificar o caixa eletrônico com um pé de cabra para retirar o dinheiro. Depois do incidente, teve que se submeter a tratamento psicológico e foi transferida de local de trabalho.

    Na visão do relator, o simples fato de se tratar de guarda municipal não é suficiente para afastar a responsabilidade do empregador. "Ao autorizar a instalação de um caixa eletrônico nas suas dependências, deveria ter aumentado a segurança do local, seja através da instalação de equipamentos vigilância ou designação de vigilante armado, a fim de evitar a exposição de seus empregados a eventuais infortúnios, o que não ocorreu", destacou no voto, entendendo que a conduta omissiva por parte do reclamado expôs a perigo a saúde e integridade física da reclamante.

    "Não obstante o risco social a que todos se sujeitam e às questões de déficit de segurança pública, o certo é que não se pode deixar que o trabalhador arque com as consequências geradas pela insegurança no desempenho de suas funções", concluiu ao final, identificando, no caso, os requisitos do dever de indenizar.(0010278-75.2013.5.03.0073 Pje 11/11/2014)

 

Situação 3 - Transporte de valores: risco implícito, obrigação legal. 

     Nos termos da OJ 22 do TRT de Minas, "O transporte de valores sem o atendimento das exigências previstas na Lei n 7.102/83 expõe o empregado a risco e enseja o pagamento de indenização por dano moral, ainda que ele não tenha sido vítima de assalto". (Disponibilização/divulgação: DEJT/TRT3 23/04/2013, 24/04/2013 e 25/04/2013).

    Com base nesa orientação, a 1ª Turma do TRT-MG manteve a decisão de 1º Grau que condenou uma instituição bancária a reparar por dano moral um empregado que realizava o transporte de numerário para fora da agência, em infração ao disposto na Lei 7.102/19.

    O desembargador Emerson José Alves Lage, relator do recurso da ré, se amparou nas declarações das testemunhas no sentido de que o transporte de valores era feito pelo reclamante sem o acompanhamento de segurança e muito menos de empresa especializada. Neste caso, como explicou, sequer há necessidade de prova do dano, sendo a conduta ilícita praticada pelo empregador passível de reparação.

    Portanto, com respaldo nos elementos caracterizadores da responsabilidade civil do empregador, nos termos dos artigos 186 e 942 do Código Civil e artigo 7º, XXVIII, da Constituição Federal, a Turma negou provimento ao recurso da ré e confirmou a condenação ao pagamento de indenização no valor de R$ 10 mil. Para os julgadores, a importância atende os critérios de proporcionalidade, razoabilidade e extensão do dano, além de estar em consonância com o que vem sendo decidido.(00610-2013-162-03-00-4 - 08/09/2014)

 

Situação 4 - Motorista em estrada: segurança é obrigação do Estado. 

    Já a 8ª Turma negou provimento ao recurso de um motorista que pretendia receber indenização por dano moral ao fundamento de que corria risco de violência no exercício de sua função. No processo, ficou demonstrado que o reclamante fazia entrega de bebidas, recebendo valores quando o pagamento não era efetuado por meio de boleto bancário.

    Na visão do relator, juiz convocado José Marlon de Freitas, a situação não se enquadra na Lei 7.102/83, que se destina às empresas que realizam vigilância ostensiva e transporte de valores utilizando pessoal próprio para execução dessas atividades. Após analisar as provas, ele entendeu que a empresa não poderia ser responsabilizada pela segurança do empregado.

    "Não se desconhece o fato de que toda a sociedade está inserida em um complexo quadro de violência, sujeita a roubos e assaltos de um modo geral. Todavia, não se pode atribuir notoriedade maior ao roubo de cargas de bebidas, superior aos riscos de assaltos de outras cargas, uma vez que as ameaças estão voltadas para qualquer tipo de mercadoria transportada", ponderou no voto.

     No caso, o próprio reclamante confessou que a reclamada adotava medidas de segurança, como a implantação nos veículos de rastreador e cofre de dinheiro e cheques. O julgador chamou a atenção para o fato de reclamada também sofrer o impacto da violência que acomete a população em geral, tanto que já sofreu assaltos.

    Afastando os requisitos ensejadores da responsabilização civil, nos termos do artigo 186 e 927 do Código Civil, confirmou a sentença que julgou improcedente a pretensão. (01528-2013-086-03-00-9 - Data: 09/07/2014).

 

Situação 5 - Riscos comuns das ruas: impossível responsabilizar empregador. 

    Na mesma linha de raciocínio, a 4ª Turma manteve a sentença que isentou uma empresa de ônibus a pagar indenização por dano moral a um cobrador, que alegou ter sofrido abalo psicológico em razão de um assalto ocorrido enquanto trabalhava. Em seu recurso, o trabalhador havia argumentado que a empresa deveria ser condenada com base na responsabilidade objetiva, o que não foi acatado.

    Atuando como relator, o desembargador Paulo Chaves Correa Filho, lembrou que, para reconhecimento da responsabilidade objetiva a atividade econômica deve criar o risco de dano, que deve ser indenizado pelos beneficiários dessa atividade. Nessa situação pressupõe-se sempre a possibilidade de um perigo, decorrente da atividade empresarial ou de circunstâncias objetivas, fora de controle humano habitual. E, na visão do julgador, isso não se aplica ao caso: "O risco de ser assaltado não é inerente à atividade de cobrador, uma vez que decorre da ação de terceiros alheios à relação contratual de trabalho, e não da atividade profissional em si", registrou no voto, considerando que empregados da empresa e demais cidadãos submetem-se aos mesmos riscos em vias públicas. Portanto, segundo esclareceu, a empregadora não criou risco para o empregado, não podendo ser considerada culpada pela ausência de segurança nas ruas.

    Ainda conforme a decisão, não houve comprovação de culpa ou dolo da reclamada evento ocorrido. Os julgadores não enxergaram qualquer descaso da empresa em proporcionar segurança a seus empregados. Por isso, não reconheceram o dever de indenização, nos termos do artigo 7º, XXVIII, da Constituição Federal de 1988. "O lamentável evento não adveio de uma condição insegura por parte da empregadora, sendo que o evento danoso foi fruto de ilícito penal perpetrado por um terceiro, totalmente estranho à relação de emprego estabelecida entre as partes", registrou o relator.

    O desembargador lembrou ainda que a ré também foi vítima da violência, uma vez que os assaltos têm por alvo o seu patrimônio. "Não pode a reclamada ser compelida a fazer as vezes do Estado, garantindo seus funcionários contra qualquer tipo de ação criminosa, quando o próprio Estado, que, repise-se, é o responsável pela segurança pública, não os garante", destacou, rejeitando o possibilidade de condenação da reclamada por supostos danos morais sofridos pelo reclamante. O fato de o trabalhador não ter sido agredido durante o assalto também pesou na decisão.

 

Fonte: Tribunal Regionall do Trabalho 3ª Região.

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